QUANDO DA CÓPULA DE MIRANDA E SUA ESPOSA...
“A Mulher [Estela] percebeu a situação e não lhe deu tempo para fugir; passou-lhe rápido as pernas por cima e, grudando-se-lhe ao corpo, cegou-o com uma metralhada de beijos.
Não se falaram.
Miranda nunca a tivera, nem nunca a vira, assim tão violenta no prazer. Estranhou-a. Afigurou-se-lhe estar nos braços de uma amante apaixonada; descobriu nela o capitoso encanto com que nos embebedam as cortesãs amestradas na ciência do gozo venéreo. Descobriu-lhe no cheiro da pele e no cheiro dos cabelos perfumes que nunca lhe sentira: notou-lhe outro hálito, outro som nos gemidos e nos suspiros. E gozou-a, gozou-a loucamente, com delírio, com verdadeira satisfação de animal no cio.
E ela também, ela também gozou, estimulada por aquela circunstância picante do ressentimento que os desunia; gozou a desonestidade daquele ato que a ambos acanalhava aos olhos um do outro; estorceu-se toda, rangendo os dentes, grunhindo, debaixo daquele seu inimigo odiado, achando-o também agora, como homem, melhor do que nunca, sufocando-o nos seus braços nus, metendo-lhe pela boca a língua úmida e em brasa. Depois, num arranco de corpo inteiro, num soluço gutural e estrangulado, arquejante e convulsa, estatelou-se num abandono de pernas e braços abertos, a cabeça para um lado, os olhos moribundos e chorosos, toda ela agonizante, como se a tivessem crucificado na cama.
A Partir dessa noite, da qual só pela manhã o Miranda se retirou do quarto da mulher, estabeleceu-se entre eles o hábito de uma felicidade sexual, tão completa como ainda não tinham desfrutado, posto que no íntimo de cada um persistisse contra o outro a mesma repugnância moral em nada enfraquecida”.
[ Do Capítulo I de “O Cortiço” de Aluísio Azevedo, em analogia aos cultos pentecostais e ao encontro de Jesus, “o Noivo” e de sua “Noiva”, a igreja...]
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